terça-feira, 1 de junho de 2010

Porque não pretendo ir à XIV Parada do Orgulho LGBT de São Paulo

RE-PENSATA



Tenho uma relação de amor e ódio em relação à Parada do Orgulho LGBT de São Paulo e sua organização. Quando fui a primeira vez, e as 3 ou 4 seguintes, foi uma experiência de libertação sem precedentes! Principalmente pelo caráter público de massa que torna o evento visível e anônimo ao mesmo tempo, ou seja, permite a todos os participantes vivererem seus amores e desejos e se enxergarem parte de um todo sem necessariamente serem apontados diretamente. Uma visibilidade invisível.
Nessa época fui atrás da organização da Parada, a Associação da Parada do Orgulho LGBT (APOLGBT), um grupo criado exclusivamente para o evento,  e me deparei com uma situação no mínimo crítica: o lugar no qual estavam instalados era péssimo. Segundo os mesmos, se tratava de uma sala no Edifício Andraus cedida pela Prefeitura de São Paulo, ou seja, um empréstimo. Diziam não ter maneiras de possuir uma sede própria, mas, ao questionar como poderia fazer para me associar, já que queria fazer parte mais direta do movimento, desconversaram. Lembrei q à época da minha segunda parada havia um documento para associar-se no site da APO, mas depois o mesmo sumiu.
Com o tempo percebi que não havia uma intenção real de novos associados e a situação de possuir uma salinha tosca e mal cuidada emprestada pela Prefeitura no Andraus era satisfatória, afinal não se teria de arcar com gasto algum com relação a isso. Me perguntei o por que de não haver um movimento realmente independente na cidade de São Paulo, sem necessariamente precisar de esmola do poder público (me pergunto, inclusive, qual a obrigação da municipalidade em arcar com gastos de uma sede de uma associação; por isso a situação me parece tão conveniente).
Muitos argumentarão, e é dessa forma que a APO reiteradamente faz, q a associação não tem receita, que o pagamento dos associados é simbólico, etc. Lembro, no entanto, que o Grupo Nuances, do Rio Grande do Sul, de defesa dos direitos dos homossexuais, possui não apenas meios de arrecadação e uma sede própria como publica livros, jornal mensal, possui artigos para compra e ações totalmente descoladas, por exemplo, de verbas provindas do Ministério da Saúde. Sabe-se que historicamente muitos desses grupos nasceram das ações de enfrentamento do HIV, mas o Nuances sempre se negou a alocar verba por projetos de saúde por entender que seu papel é político e social, e não necessariamente de ações de saúde pública. A lacuna a preencher , nesse sentido, são ações de militância política e representatividade pública de uma minoria social e jurídica, não de prevenção da Aids.
Quando se observa, por exemplo, de onde vem os recursos da APO (ultimamente também do MinC, da Caixa e da Petrorás, ou seja, há injeção de dinheiro público na Parada), invariavelmente surge o Ministério da Saúde. Desculpem, mas é um saco ser alocado sempre na problemática da Aids e depender disso para garantir algum evento. Preferiria não haver algo dessa grandeza, como a Parada, a ter de conviver com a pecha de 'grupo de risco'.
Minhas objeções vão nesse sentido: na minha opinião não há real interesse em criar um movimento independente do poder público e nem angariar recursos por outros meios que não os certeiros vindos do Ministério da Saúde. Essa esmola social é cômoda. Além disso, a proximidade política da APO com certos partidos políticos tem impedido sua direção tenha ações efetivamente independentes (da ABGLT também). Não sou ingênuo e não acho possível haver um grupo sem proximidade político partidária, mas há sim a necessidade de um distanciamento saudável que permita haver ações e críticas incisivas quando necessário (lembro da notícia da visita do presidente do Irã e do quanto a ABGLT e outros grupos demoraram a se manifestar por apoiar deveras o governo a Lula; aqueles que quisessem protestar deveriam procurar os eventos organizados por grupos de defesa dos Direitos Humanos mais amplos e de combate ao AntiSemitismo; quase na chegada do presidente a ABGLT publicou uma carta...). Curioso que isso ocorre também no caso do Nunaces acima citado, mas parece corroer a direção do grupo bem menos do que em São Paulo.
 Também não concordo que a realização deste evento fique a cargo de um grupo criado apenas para organizá-lo. Seria melhor, na minha opinião, constituir-se em questão tratada com os diversos grupos existentes na cidade e na sociedade a fim de que haja a inserção de novos atores e questionamentos.
Enfim, também acho importante forçar o lance para um cunho político central, apesar disso ser bater na mesma tecla. Ir às ruas é fazer política, mas com os anos isso ficou cada vez mais diluído. Sem contar os poucos avanços políticos concretos. Repensar a Parada tendo em vista sua origem: em NY e outras cidade as Paradas não possuem carros de som tocando música eletrônica o tempo todo. Há um espaço para  os participantes marcharem entoando gritos de protesto e ostentando faixas e cartazes que evidenciam seus anseios e seu rebaixamento social. Surge, de maneira mais clara, quem são as famílias que perderam filhos por conta da homofobia, por exemplo. Os grupos, muitas vezes, são organizados por classes profissionais ou que se entendam em algum grupo específico (gays, lésbicas, transsexuais, bissexuais, etc). Isso é meio separatista, mas permite um protesto de fato setorizado e objetivo. A Parada de SP tem mostrado ao mundo como realizar um grandioso evento turístico que traz dividendos enormes ao poder público, ao setor hoteleiro e gastronômico e às companhias de viagem. Com que parte disso temos ficado? Ou, como q parte os grupos tem ficado? Com as piadinhas CQCistas da TV? Com o Casseta &Planeta fazendo ‘humor’? Com a possibilidade de dançar Bad Romance na Paulista? Parece pouco...
Ano passado houve uma movimentação para se fazer algo diferente na Parada: protestar. Eu, pelo menos, não tenho muitos motivos para festa. E, se não for para protestar, não irei. Esse será meu protesto.